Não é poema não
São retalhos que caíram
quando eu lia Adélia Prado.
Decidi: vou comprar um violão
O meu ficou para trás.
Meu pai, minha mãe
Eles também se foram.
Gosto da frase:
'O que quer que seja o amarelo'
Poesia tem disso.
Intimidade com processos
físico químicos.
Sim. E é assim que se escreve
na nova ortografia?
Físico químicos!
Tive um sonho horrível
Insetos caminhavam em meu corpo
e não eram centopeias.
No escuro. Cela fechada.
Espera por tudo.
Hoje escrevo ao sol
na praça aqui da rua.
A praça?
Arrasada. Terra seca. Grama em palha.
Mas tem dois balanços.
Gosto de andar de balanço.
Na escola eu andava em pé
e batia corrida: ganhava quem chegava mais alto.
Com o tempo 'o medo virou Deus e Senhor'.
'Ter um corpo é como fazer poemas'
Espero que os meus cresçam como
rabo de lagartixa.
A cada susto um novo!
Os gatos aqui de casa
não deixam lagartixa crescer
Imagine ter rabo pra perder!
Tem bicho que é assim
Mata o corpo da gente.
O que cresceu em mim
foi arrancado.
Estou mais pra gato do que lagartixa.
Meus poemas
têm querer em rabo de lagartixa.
Gostam de nascer outro e de novo.
Adélia Prado gosta de borboletas e centopeias
Prado, Adélia. A faca no peito. Rio de Janiero/São Paulo: Record, 2007.